O Toc na infância merece a nossa atenção

24/02/2013 23:09

CRESCER conversou com a psiquiatra Ana Beatriz Barbosa Silva, autora de Mentes e Manias, para esclarecer dúvidas sobre o transtorno obsessivo-compulsivo em crianças


 

Heloiza Camargo


 

ThinkStock
 

Crianças são cheias de manias. Você bem sabe disso. Só que essa característica também está ligada a quem tem o transtorno obsessivo-compulsivo (TOC). Para diferenciar o que é próprio da fase do seu filho ou um problema é preciso observar a frequência em que essas manias acontecem. Ou seja, quando a criança simplesmente não consegue deixar de fazê-las e sofre com isso. Mas lembre-se: só um especialista pode dar o diagnóstico. Nem tudo é TOC. Para entender melhor sobre o transtorno, CRESCER conversou com a psiquiatra Ana Beatriz Barbosa Silva, que recém-lançou Mentes e Manias (Ed. Fontanar/Objetiva R$ 34,90). Na obra, ela dedica um capítulo inteiro para falar do TOC na infância.

CRESCER – O TOC tem idade para começar?
Ana Beatriz Barbosa Silva – Geralmente, começa na adolescência, mas pode aparecer na infância também, entre 6 e 8 anos, em média. Essa é justamente a fase em que a criança começa a ser ver como indivíduo e parte de uma sociedade. Até então, ela achava que era uma extensão dos outros ao seu redor. E para esse amadurecimento natural é comum que ela adote certos rituais e apresente pensamentos obsessivos. Por exemplo: as crianças costumam temer muito a morte da mãe, então, elas coçam o nariz três vezes para protegê-la, ou só andam nas pedrinhas brancas quando estão na rua. Essas pequenas manias fazem parte do crescimento. O problema está quando, junto com elas, vem um alto nível de ansiedade - e o que era só esporádico vira rotineiro e passa a atrapalhar a socialização -, como aquela criança que não consegue ir para a casa de um amigo porque tem medo de deixar a mãe sozinha e algo de ruim acontecer com ela.

CRESCER – Como diferenciar manias de TOC?
A.B.B.S.
– O TOC traz sofrimento. A criança não consegue deixar de repetir aquele ritual, e isso compromete a sua vida na escola, com a família, os amigos. É importante prestar atenção no seu filho e ver se aquelas manias típicas da infância não ultrapassam a linha do que é saudável ou não. Uma criança que tem pavor de se sujar, e precisa trocar de roupa imediatamente, e aquela que arruma o quarto de um modo que, se alguém mexer, ela se tornará explosiva, são casos que merecem atenção. Outro exemplo são aquelas que não admitem um erro: se escrevem uma palavra com a grafia incorreta, não são capazes de passar a borracha no caderno, arrancam a folha e começam tudo de novo. Mexer sistematicamente em machucados, arrancar as casquinhas ou fios de cabelo e pêlos da sobrancelha. Tudo isso pode ser indício de TOC. Mas essas coisas têm de envolver sofrimento, porque as crianças simplesmente não conseguem não fazer.

CRESCER – O TOC em crianças acontece da mesma forma que nos adultos?
A.B.B.S.
– Nas crianças há o agravante de que elas ainda vivem em um mundo permeado por fantasia. Isso quer dizer que elas realmente acreditam que, se não ficarem o dia todo monitorando a mãe pelo celular, ela poderá morrer. O adulto, por outro lado, tem consciência de que os seus rituais não são lógicos, apesar de ambos não conseguirem controlá-los. Até por isso é mais fácil o diagnóstico nas crianças. Por mais que elas não falem abertamente sobre a questão, elas dão muito mais indícios. Já os adultos se sentem constrangidos e geralmente escondem o problema.

CRECER – Como o transtorno é desencadeado?
A.B.B.S.
– É preciso ter uma predisposição genética para desenvolver TOC e algum fator que o desencadeie. Nas crianças, pode ser um estresse prolongado (que dure entre 1 e 2 anos), como a separação complicada dos pais, algum parente com uma doença séria, o bullying na escola. Crianças com essa carga genética também serão mais perfeccionistas e extremamente controladoras. Porém, o mais importante não é descobrir o que desencadeou o TOC, mas sim tratá-lo.

CRESCER – E como é o tratamento?
A.B.B.S.
– O TOC é o transtorno que mais mexe com a taxa de serotonina, uma espécie de antidepressivo cerebral. Funciona assim: quanto mais baixo o nível de serotonina, maior a incidência de pensamentos negativos e obsessivos. Então, o primeiro passo é procurar um médico, já que o problema não melhora espontaneamente. O tratamento é medicamentoso e psicoterápico. Remédios para controlar a taxa de serotonina e terapia para expor a criança ao objeto de obsessão ou a situações que antes ela achava catastrófica – o objetivo é que ela perca completamente o medo e bloqueie o ciclo de pensamentos ruins. Por isso, os pais não podem ter preconceito em dar remédio para os filhos. No livro, uma mãe diz em seu depoimento que foi muito difícil a decisão de dar medicamentos psiquiátricos para o seu filho, mas, no fim, ela percebeu que era como se ele tomasse remédios para o coração, por exemplo. Ele teria que conviver com aquilo. Tratar o TOC na infância abre uma possibilidade enorme de que na idade adulta, fase mais crítica, o transtorno fique em um grau mais leve.

Fonte: https://revistacrescer.globo.com/Revista/Crescer/0,,EMI243160-15151,00.html

 

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Paula Reis Psicopedagoga Clínica e Institucional- ABPp nº 12506